«Se vivemos no Espírito, sigamos também o Espírito» (Gl 5, 25).
O ícone escreve-se e ainda se transcreve porque só o gesto da escrita é um acto
sagrado que o iconógrafo realiza na esteira de uma tradição que envolve não só
a imagem, sempre ditada por um preciso cânone, mas também a técnica da pintura,
a escolha do material, a sequência do trabalho... Se, aparentemente, a
repetição pode parecer um limite imposto à criatividade, é em virtude dessa constante
réplica que o autor é convidado a ir ao fundo do significado expresso pelo
protótipo, repetindo-o ele mesmo como uma oração.
Desde o século VI, quando, na Síria e na Palestina, surgiram as primeiras
imagens do Pentecostes, a tipologia iconográfica desta celebração permaneceu
quase idêntica, com excepção de uma significativa variante relativa à presença
de Maria entre os Apóstolos. Separando-se as festas da Ascensão e do
Pentecostes, Maria, até então figura da Igreja, desaparece principalmente
porque, com a descida do Espírito Santo, os próprios apóstolos encarnam, da
Igreja, a vocação missionária. O lugar vazio torna-se, assim, sinal da
presença, invisível mas concreto, de Cristo, que é a sua cabeça.
O ícone, que deve ser lido à luz de toda a revelação bíblica, mostra o colégio
dos Apóstolos: Paulo, aqui, substitui Matias porque a mensagem que a imagem
quer transmitir é o anúncio a todo o mundo da Boa Nova, tornado possível pela
intervenção do Espírito. O Discípulo dos Gentios tem o Livro das Escrituras entre
as mãos, como fazem também os evangelistas Mateus, João, Marcos e Lucas, embora
os dois últimos não apareçam historicamente no número dos Doze relatados pelos
Actos. Pedro, defronte a Paulo, e os outros discípulos são dotados do rolo de
pregação.
O espaço pintado, que, como costuma acontecer nos ícones, é “aberto” para
convidar os fiéis a tomarem parte no mistério representado, enfatizando, ao
mesmo tempo, o seu significado universal, corresponde ao Templo, delimitado nas
laterais por torres e aberto em direcção ao alto porque o anúncio do Reino de
Deus está destinado a atingir todo o mundo. O Templo é, de facto, o lugar onde
a fé se manifesta publicamente e os Doze sentados em semicírculo no seu
interior são, aqui, a imagem viva.
No ambiente abaixo, emoldurado por um arco, um idoso segura uma mortalha na
qual estão dispostos pergaminhos, doze quantas as tribos de Israel: é um rei e
representa o Cosmos, quer dizer, o conjunto dos povos e das nações a que é
endereçado o dom do Paráclito. Que os Discípulos acabam de receber da abóbada celeste
de onde vêm os raios vivificantes. Eles agora são uma só coisa, em nome de
Jesus, prontos para ir e proclamar a única Palavra que o mundo espera.
Margherita del Castillo
Através de La Nuova Bussola Quotidiana
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«Tudo me é permitido, mas nem tudo é conveniente» (cf. 1Cor 6, 12).
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