A memória do que foram as Rogações,
infelizmente, está-se a perder na Igreja.
As Rogações são procissões que, desde tempos imemoriais, a Igreja convocou para
implorar a ajuda do céu contra as calamidades. As origens desta cerimónia são-nos
contadas, de forma diferente, mas complementar, por dois grandes monges
beneditinos, que também foram dois grandes estudiosos: o Beato Cardeal
Ildefonso Schuster e Dom Prosper Guéranger, Abade de Solesmes.
O Cardeal Schuster, no seu Liber Sacramentorum, afirma que as origens
históricas das Rogações remontam à antiga festa dos Robigalia pagãos, em
que a juventude romana atravessava a ponte Mílvia para sacrificar, em Rovigo, o
deus que preservava as searas da ferrugem. A Igreja Romana cristianizou esse
costume popular. Com efeito, a Igreja, em vez de reprimir violentamente os
antigos costumes, profundamente enraizados no coração das pessoas, sempre os conservou,
dando-lhes um novo sentido espiritual. Assim, nos primeiros séculos, foi
introduzida a procissão das Rogações, que, do centro de Roma, se dirigia a São Pedro
percorrendo a Via Flaminia, a ponte Mílvia e costeando o Tibre até ao Vaticano.
Essa procissão era chamada de Ladainha Maior, para distingui-la das Ladainhas
Menores, ligadas às stationes, um termo que deriva o seu nome do
mundo militar, para indicar as paragens que ocorriam nas procissões de igreja
em igreja durante determinados tempos litúrgicos.
Ao contrário dessas procissões menores, as Rogações tinham um carácter muito
mais solene; o percurso era muito longo e nele participava toda a população de
Roma, dividida em vários grupos. Parece que a instituição oficial se deva a São
Gregório Magno, que, no ano 590, para obter a cessação da peste, organizou uma litania
septiformis, isto é, uma procissão geral do clero e da população romana,
formada por sete cortejos que convergiram para a Basílica Vaticana. Ao chegar
ao Mausoléu de Adriano, São Gregório Magno, olhando para cima, viu, no topo do
Castelo, um Anjo exterminador que colocava na bainha a espada ensanguentada, em
sinal da cessação do castigo.
Dom Guéranger fala-nos, em vez, de um rito instituído pela primeira vez em
Vienne, na França, por iniciativa do Bispo São Mamerto (cerca de 470). Escreve
assim: «Calamidades de todos os tipos vieram trazer a desolação a esta
província, recentemente conquistada pelos Borgonheses. Terramotos, incêndios,
fenómenos terríveis agitavam as populações, como se fossem sinais da cólera
divina. O santo Bispo que desejava elevar a moral de seu povo e conduzi-lo a
Deus, cuja justiça precisava de ser apaziguada, prescreveu três dias de
expiação, durante os quais os fiéis se deveriam entregar às obras de penitência
e ir em procissão ao canto dos salmos».
As Rogações da Gália rapidamente se espalharam em toda a Igreja Ocidental.
Cesário de Arles, no início do século VI, conta-nos que estas procissões eram
formadas pelo clero e pelo povo de várias igrejas secundárias que procediam sob
a cruz de uma igreja principal, descalços e cantando hinos sagrados. Também
foram adoptadas em Roma, em 801, sob o pontificado de São Leão III. As Rogações
já existiam, mas havia esta diferença: que em Roma se conservou na Procissão
que acontecia a 25 de Abril, e era dita de São Marcos, o nome da Ladainha
Maior, e chamou-se Ladainhas Menores às das Rogações; enquanto estas
últimas, na França, foram designadas com o nome de Ladainhas Maiores,
reservando o nome de menores para a Ladainha de São Marcos.
Dom Guéranger recorda que Carlos Magno tirava os sapatos como o último dos
fiéis e caminhava descalço, seguindo a cruz, do seu palácio até à Igreja da
Estação. No século XIII, Santa Isabel da Hungria também dava o mesmo exemplo; ficava
feliz, durante as Rogações, por se misturar com as pobres mulheres do povo, caminhando
também ela descalça, coberta por áspera veste de lã.
Era este o espírito da cristandade que São Pio V e São Carlos Borromeu
renovaram no seu tempo. A fome, bello et peste, libera nos Domine: da
fome, da guerra e da peste, livrai-nos, Senhor, cantava-se e ainda se canta
nas Rogações, onde essas sobrevivem. É este o espírito de que precisamos para esconjurar
as calamidades que pairam sobre a nossa sociedade.
Roberto de Mattei
Através de Radio Roma Libera
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