No Vaticano, a Misericórdiazinha acabou.
Ou melhor: não está contemplada nos protocolos sanitários do menor Estado do
mundo. O decreto do Presidente da Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade
do Vaticano, cardeal Bertello, «em matéria de emergência sanitária pública»,
é extremamente claro. O decreto incorpora as medidas aplicadas em grande parte
dos Estados europeus e em Itália quanto ao distanciamento, ao uso de
dispositivos de protecção, à limitação de circulação. As violações destas
disposições estão sujeitas a sanções. Tudo isto é justificado pelo estado de
“emergência sanitária” em que nos encontramos.
Para definir o conceito de “emergência sanitária”, o documento vaticano assume
plenamente a definição dada pela Organização Mundial da Saúde, que,
evidentemente, assumiu valor magisterial nos Palácios Sagrados.
Entre os comportamentos que o Vaticano acredita estarem em violação das normas
de saúde pública, está também a recusa a submeter-se à vacinação anti-COVID. Dizia-se
que a misericórdia acabou e pode-se deduzi-lo do facto de que o funcionário
vaticano “réu” de tal culpa está sujeito a sanções económicas, podendo até ser
despedido.
Mas, do ponto de vista estritamente sanitário, tal decisão é justificada? Vejamos
o que diz o documento, assinado pelo cardeal Bertello, que inicia com um
panorama do problema da epidemia: «Dar uma resposta sanitária, tomar as acções
imediatamente necessárias para responder à pandemia, tendo também em vista os
seus efeitos a longo prazo, é importante para que possa ter lugar uma cura
global e regenerativa».
Uma definição, esta última, decididamente retumbante. Uma «cura» total?
E, até mesmo, «regenerativa»? Uma espécie de utopia de saúde total, com uma
remissão da doença, mas mesmo com uma «regeneração» da humanidade. E
tudo isto realizar-se-ia com uma vacina, numa espécie de grande salto transhumanista?
De que modo? Não é dado a saber. Não há explicações médicas. Só nos dizem que ocorre
trabalhar para que, por meio da vacinação global, este prodígio possa acontecer.
O documento, pouco depois deste voo áulico, retoma o voo rasante, entrando no
específico da necessidade e obrigatoriedade da vacina: «Considera-se que
submeter-se à vacinação é tomar uma decisão responsável, visto que a recusa de
uma vacina pode representar um risco para terceiros e que tal recusa poderia
aumentar os riscos para a saúde pública». Uma «decisão
responsável» que, no entanto, é, de facto, obrigatória, coerciva, sob pena
de multas e perda do trabalho.
Mas onde o documento vaticano se torna completamente questionável de um ponto
de vista científico é quando afirma que a recusa em submeter-se constitui um risco
para os outros. De que modo? Suponhamos que um sacerdote de um dos escritórios
da Cúria, ou um jornalista da Rádio Vaticana, não tenha feito a vacina e se
encontre a trabalhar, lado a lado, com os colegas vacinados. Pode ser um perigo
para eles? A resposta é não. Se os outros estão imunizados contra o COVID, não
poderão, de modo algum, ficar doentes por culpa do colega não vacinado.
E o que dizer da afirmação sucessiva, de que os não vacinados poderiam «aumentar
os riscos para a saúde pública»? Esta é uma demonização do não vacinado,
visto como um propagador, um potencial inimigo da comunidade, resultando numa
discriminação indevida. Se quisessem ser coerentes com esta afirmação, seria
necessário afastar da vida pública todos os portadores de HIV ou de Hepatite C,
que representariam um risco para a saúde pública. Mas, obviamente, um portador,
saudável ou doente, dessas patologias sabe como comportar-se em relação àqueles
com quem se relaciona e os não vacinados fariam o mesmo, antes de tudo, para se
proteger.
Se uma pessoa não vacinada (que, entre outras coisas, já pode estar imune por
ter tido a doença) respeita as normas higiénicas de comportamento, não é uma
ameaça para ninguém. Por fim, o documento, daquele que, agora, poderíamos
definir Vaxticano, parece desposar, fideísta e acríticamente, as teses de que
as actuais vacinas funcionam, têm uma protecção absoluta, conduzem, por fim, à
regeneração. Porém, os próprios fabricantes admitem não saber quanto tempo poderia
durar o efeito imunizante da vacina e a Pfeizer, na ficha técnica da sua mítica
Comirnaty, fala de 9-12 meses garantidos, não mais. Para não falar dos efeitos
colaterais das vacinas.
Tudo isso além do Tibre não parece interessar. A vacina é um novo dogma de fé,
um imperativo ético, um dever do cidadão. Antecipando todos, a Santa Sé já preparou o “cartão digital de vacinação”, sem o qual não será possível
trabalhar, viajar, ter uma vida social. Talvez o Grande Irmão tenha encontrado lar
em Roma.
Paolo Gulisano (Médico)
Através de La Nuova Bussola Quotidiana
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