No seguimento das infaustas declarações de Jorge Mario
Bergoglio, por ocasião de uma audiência no passado sábado, em que abordou, uma
vez mais, a peçonhenta adesão ao Vaticano II, qual conciliábulo, o portal Dies
Iræ publica, em primeira mão, um pertinente artigo da autoria de José Antonio
Ureta.
O pontificado de Francisco
representou uma verdadeira mudança de paradigma até em relação à imposição, aos
tradicionalistas, das novidades do Concílio Vaticano II: passou-se da cenoura
ao pau, dos incentivos às ameaças.
Quando ainda cardeal, Joseph Ratzinger havia reconhecido, com honestidade, que «verdade
é que este particular Concílio [Vaticano II] não definiu dogma algum e,
deliberadamente, escolheu permanecer num nível modesto, como um concílio
meramente pastoral» (Discurso em Santiago do Chile, 1988). Na mesma
ocasião, o então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé lamentou o facto
de que, «no entanto, muitos o consideram quase como se fosse um super-dogma que
priva de significado todos os outros concílios».
Depois, enquanto Papa, reconhecendo que havia ambiguidade de interpretação nos
textos conciliares, Bento XVI propôs, aos que questionavam a sua ortodoxia, a
cenoura da “hermenêutica da continuidade” com o magistério tradicional. A cenoura
teológica ratzingeriana não apeteceu às principais figuras críticas do
Concílio, tais como Mons. Brunero Gherardini, o Prof. Roberto de Mattei, os
teólogos da Fraternidade S. Pio X e ainda outros, que rejeitaram a proposta,
argumentado que não era suficiente proclamar a suposta continuidade do Vaticano
II com o magistério precedente, mas era preciso demonstrá-la.
Francisco abandonou a cenoura e não somente abraçou, abertamente, a tese da
ruptura do magistério novo com o magistério tradicional, mas agora empunhou o pau.
Com efeito, no discurso para celebrar o 25.º aniversário do Catecismo de João
Paulo II, o Papa Bergoglio declarou: «A Tradição é uma realidade viva; e
somente uma visão parcial pode conceber o “depósito da fé” como algo de
estático. A Palavra de Deus não pode ser conservada em naftalina, como se se
tratasse de uma velha coberta que é preciso proteger da traça! Não. A Palavra
de Deus é uma realidade dinâmica, sempre viva, que progride e cresce, porque
tende para uma perfeição que os homens não podem deter».
E, na audiência deste sábado (30 de Janeiro), brandiu o pau. Dirigindo-se aos
membros do Escritório Catequético da Conferência Episcopal Italiana, que
celebrava o 60.º aniversário do início das suas actividades de renovação da
catequese nos moldes do Concílio Vaticano II, o Papa Francisco afirmou em tom
ameaçador: «O Concílio é magistério da Igreja. Ou estás com a Igreja e,
portanto, segues o Concílio, e se não segues o Concílio ou o interpretas à tua
maneira, à tua própria vontade, não estás com a Igreja».
Ou seja, voltou-se ao super-dogma. Com uma circunstância agravante: de ora em
diante, não é mais aceitável sequer dar ao Vaticano II outra interpretação do
que aquela oficial. À vista disso, Francisco faz uma dupla dogmatização: 1.º do
Concílio e 2.º da sua interpretação. O que parece pouco harmonizável com o carácter
pastoral e voluntariamente não dogmático da assembleia conciliar.
Em França, os coitados dos alsacianos, que foram integrados, à força, no
Exército alemão – sob a alegação de que eram de raça germânica –, são conhecidos
como os “malgré nous”, porque
foram recrutados contra a própria vontade. Os documentos do Vaticano II, pela vontade
autocrática do Papa Francisco, passaram a ser os “malgré nous” do
magistério, já que foram, por ele, incorporados, à força, entre os documentos
infalíveis, contra a vontade manifesta dos padres conciliares, que os aprovaram,
e de Paulo VI, que os ratificou.
Não
há dúvida de que o Pontífice tem o direito de empregar o carisma de
infalibilidade com o qual Jesus Cristo dotou a sua Igreja. Mas deve fazê-lo
respeitando os requisitos de solenidade, universalidade e manifestação expressa
da vontade de definir, que a Teologia exige das declarações ex cathedra. Uma dogmatização do
Vaticano II feita num aparte improvisado de uma audiência não tem a força
magisterial requerida para obrigar as consciências. E menos ainda para
justificar a exclusão do seio da Igreja, implícita nas suas palavras.
O mesmo pontífice que não condena, mas abençoa, Joe Biden (apesar deste
dissentir, abertamente, do ensinamento da Igreja em questões morais essenciais,
como o aborto e a agenda LGBTQ), é inexorável com aqueles que questionam o
Vaticano II: «Temos que ser exigentes e rigorosos neste ponto. O Concílio
não deve ser negociado para ter mais destes... Não, o Concílio é assim.
[...] Por favor, nenhuma concessão para aqueles que tentam apresentar uma
catequese que não esteja de acordo com o Magistério da Igreja».
Nessa última frase, transparece, mais uma vez, a identificação abusiva
do Magistério da Igreja com as novidades do último Concílio, transformando-o no
«super-dogma que priva de significado todos os outros concílios», como denunciou
o Cardeal Ratzinger. Essa identificação só se justificaria a partir da teoria modernista
de um depósito da fé dinâmico, cujo conteúdo evolui com a consciência da
humanidade, expressa na mudança, introduzida por Francisco, no Catecismo, para
tornar ilícita a pena de morte, contrariando as Escrituras e o ensino perene
desde os Padres da Igreja.
Estamos plenamente de acordo em que o Magistério não deve ser negociado e na
necessidade da Igreja ser rigorosa e exigente na defesa da integridade do
depósito da fé. Mas é, precisamente, por isso que muitos analistas sérios e
competentes objectam passagens dos documentos conciliares que, no seu sentido
natural, parecem inconciliáveis com o ensino tradicional.
No passado mês de Junho, tive a honra de co-assinar uma carta aberta aos bispos
D. Carlo Maria Viganò e D. Athanasius Schneider em agradecimento pelo apelo a
iniciar um debate aberto e honesto sobre o que aconteceu realmente no Vaticano
II e por identificar alguns dos pontos doutrinais mais importantes a serem
abordados em semelhante análise dos seus documentos. A troca de opiniões –
educada e respeitosa – desses dois prelados, dizia a missiva, poderia servir de
modelo para um debate ainda mais robusto, evitando-se meros ataques ad hominem.
Desafortunadamente, o Papa Francisco, nas palavras que improvisou na audiência
de sábado passado, enveredou pela senda oposta. Mas essas tornam tal debate
ainda mais urgente, posto que parecem inaugurar uma nova etapa no
relacionamento da Santa Sé com aqueles que, há várias décadas, pedem,
filialmente, um pronunciamento definitivo do Magistério a respeito das suas
objecções às novidades conciliares. O pau esgrimido prenuncia não apenas o habitual
ostracismo dos tradicionalistas, mas a sua exclusão da Igreja. Como a sofrida,
gloriosamente, no século IV, pelo grande Santo Atanásio. Que ele interceda por
nós!
José Antonio Ureta
1 Comentários
"O CVII é o único Magistério".
ResponderEliminar"Quem não segue o CVII está fora da Igreja".
"Segundo o CVII se salva também quem está fora da Igreja".
"Segundo o CVII se salva também quem está fora da Igreja".
Bom dia!
«Tudo me é permitido, mas nem tudo é conveniente» (cf. 1Cor 6, 12).
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