«Não
temais, pois anuncio-vos uma grande alegria, que o será para todo o povo: hoje,
na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias Senhor. Isto vos
servirá de sinal: encontrareis um menino envolto em panos e deitado numa
manjedoura» (Lc 2, 10-12).
Rubens deve muito a Itália: chega-nos de Antuérpia, jovem pintor com pouco mais
de vinte anos, para completar a sua formação, como era prática comum naquele
tempo. Corria o ano 1600: permanecerá no nosso belo País por oito anos,
ocupando o cargo de artista oficial na corte mantuana do duque Vicente I
Gonzaga, por conta do qual realizará várias missões que lhe permitirão circular
e estudar as obras antigas e as de colegas, mais ou menos, seus contemporâneos.
A dívida do flamengo é evidente numa das telas realizadas durante a sua estadia
em Itália, a última concluída antes do regresso à pátria: uma Adoração dos
Pastores de extraordinária beleza, também consideradas as suas notáveis
dimensões.
A encomenda do retábulo, destinado a uma capela da Igreja de São Filipe de
Néri, em Fermo, derivou da estima que por ele nutria o Superior-Geral da ordem dos
Filipinos, originário daquela cidade das Marcas, para o qual já estava a
trabalhar em Roma: a colocação um pouco periférica e um péssimo estado de
conservação confundiram, dentro de pouco tempo, os estudiosos sobre a real
atribuição da obra até que um genial Roberto Longhi, em 1927, literalmente
atingido pela visão, restituiu a Rubens a legítima paternidade.
Impossível não se envolver emocionalmente com o que está a acontecer. Os anjos em
voo que proclamam o feliz anúncio também nos convocam, assim como a um representativo
número de personagens que se organizam, em semicírculo, à volta do fulcro da
cena, do seu coração palpitante: o Menino resplandecente e a Virgem Maria que,
com um gesto de natural solicitude maternal, revela docemente ao mundo o seu
Salvador.
Cada um reage à sua maneira ao cumprimento de um Acontecimento que, até pouco
antes, era impensável, indizível: o corpulento pastor, em primeiro plano,
vestido de vermelho, volta-se para o homem ao seu lado apontando-lhe, repleto
de surpresa, o pequeno adormecido. Uma senhora idosa levanta as mãos em sinal
de admirada veneração, o olhar fixo no belíssimo rosto da puérpera como se
procurasse n’Ela a confirmação do prodígio que acabara de acontecer; uma jovem,
com uma cesta nas mãos, assiste à cena, sorrindo feliz para o recém-nascido.
Toda a humanidade está aqui representada, acompanhada por São José que, nas
costas de Maria, se volta para a glória angelical com os braços cruzados a
indicar a sua gratidão pelo cumprimento do desígnio de Deus.
O sinal, de que fala Lucas no seu Evangelho – o Menino envolto em panos e
deitado numa manjedoura – é a única fonte de luz, tecnicamente
caravaggesca, e deslumbrante, pois repousa gradualmente sobre cada rosto e rasga,
ao mesmo tempo, com a sua claridade, a escuridão da noite em que estão
envolvidos a cabana e a paisagem.
Antecipando o que Jesus dirá de Si: «Eu vim ao mundo como luz, para que todo
o que crê em mim não fique nas trevas».
Margherita del Castillo
Através de La Nuova Bussola Quotidiana
Sem comentários:
Publicar um comentário
«Tudo me é permitido, mas nem tudo é conveniente» (cf. 1Cor 6, 12).
Para esclarecimentos e comentários, queira contactar: info@diesirae.pt