A menos de uma semana do Santo Natal, o
portal católico Dies Iræ traduziu e publica uma meditação de Mons. Carlo Maria
Viganò. O texto, enviado pelo próprio, aborda, de forma nítida e à luz da Fé,
os acontecimentos que marcaram este ano e prepara-nos para o que se aproxima. Neste primeiro dia da novena do Santo Natal, asseguramos as nossas preces a todos os nossos leitores.
13 de
Dezembro de 2020
Dominica Gaudete, III Adventus
Dormi, ó Celeste; os povos
Quem nasceu não sabem;
Mas o virá o dia que nobre
Herança Vossa serão.
Que naquele humilde repouso,
Que na poeira escondido,
Conhecerão o Rei.
Manzoni, Il Natale
Em menos
de duas semanas, pela graça de Deus, concluir-se-á este 2020 marcado por
acontecimentos terríveis e grandes convulsões sociais. Permitam-me formular uma
breve reflexão, com a qual dirigir um olhar sobrenatural tanto para o passado
recente como para o futuro iminente.
Os meses que deixámos representam um dos momentos mais sombrios da História da
humanidade: pela primeira vez, desde o nascimento do Salvador, as Santas Chaves
foram usadas para fechar as igrejas e limitar a celebração da Missa e dos Sacramentos,
quase antecipando a abolição do Sacrifício quotidiano profetizada por Daniel,
que acontecerá durante o reinado do Anticristo. Pela primeira vez, a Páscoa da
Ressurreição obrigou muitos de nós a assistir às celebrações através da
Internet, privando-nos da Comunhão. Pela primeira vez, tomámos conhecimento,
com dor e consternação, da deserção dos nossos Bispos e dos nossos párocos,
barricados nos seus palácios e nas suas casas paroquiais por medo de uma gripe
sazonal que fez quase o mesmo número de vítimas dos últimos anos.
Vimos – por assim dizer – os generais e os oficiais abandonarem o seu exército
e, em alguns casos, juntarem-se ao lado inimigo, impondo-nos uma rendição
incondicional às absurdas razões da pseudo-pandemia. Nunca, ao longo dos
séculos, tanta pusilanimidade, tanta covardia, tanto desejo de ceder aos nossos
perseguidores encontraram terreno fértil em quem, para nós, deveria ser guia e líder.
E o que mais escandalizou muitos de nós foi constatar que essa traição envolveu
muito mais os líderes da Hierarquia do que os sacerdotes e os simples fiéis.
Precisamente do mais alto Sólio, do qual deveríamos esperar uma intervenção
autorizada e firme em defesa dos direitos de Deus, das liberdades da Igreja e
da salvação das almas, recebemos o convite para obedecer a leis iníquas, a normas
ilegítimas, a ordens irracionais. E nas palavras que, de Santa Marta, os media
prontamente difundiram, reconhecemos muitos, demasiados piscares de olhos à
linguagem iniciática da elite globalista: fraternidade, salário universal,
nova ordem mundial, build back batter, great reset, nada mais será como antes,
resiliência. Todas palavras da neolíngua que testemunham o idem sentire
de quem as pronuncia e de quem as escuta.
Tratou-se de uma verdadeira intimidação, uma ameaça não muito velada, com a
qual os nossos Pastores ratificaram o alarme pandémico, semearam o terror entre
os simples, abandonaram os moribundos e os necessitados a si próprios. Chegou-se,
no auge de um cínico legalismo, a proibir os sacerdotes de ouvir Confissões e de
administrar os últimos Sacramentos aos abandonados nos cuidados intensivos; a
privar de uma sepultura religiosa os nossos mortos, a negar o Santíssimo
Sacramento a tantas almas.
E se, do lado religioso, nos vimos tratados como estranhos e impedidos do
acesso às nossas igrejas como os Sarracenos do passado, enquanto continuava a implacável
invasão de imigrantes irregulares a encher os cofres das auto-intituladas
associações humanitárias; do lado civil e político, descobrimos a vocação para
a tirania dos nossos governantes, que uma retórica agora desmentida pela
realidade nos faria considerar representantes do povo soberano. Dos Chefes de Estado
aos Primeiros-Ministros, dos Governadores das regiões aos Autarcas, foram-nos
impostos os rigores da lei como a súbditos rebeldes, a suspeitos a serem
vigiados até na intimidade do lar, a criminosos a serem perseguidos na solidão
dos bosques ou ao longo da margem do mar. Vimos pessoas arrastadas à força por militares
com equipamento anti-motim, idosos multados enquanto iam à farmácia, lojistas
forçados a manter as portas fechadas, restaurantes a que eram impostas custosas
medidas de segurança para, depois, decretaram o seu encerramento.
Ouvimos, com perplexidade, dezenas e dezenas de ditos especialistas – a maioria
deles desprovidos de qualquer autoridade científica e, em grande parte, em
sério conflito de interesses pelas suas ligações com empresas farmacêuticas ou
com organizações supranacionais – pontificar nos programas de televisão e nas
páginas nos jornais a propósito de contágios, vacinas, imunidade, positividade
aos tampões, obrigação de máscaras, riscos para os idosos, contagiosidade dos
assintomáticos, perigo de estar em família. Atordoaram-nos com palavras arcanas
como “distanciamento social” e “ajuntamentos”, numa série infinita de
contradições grotescas, de alarmes absurdos, de ameaças apocalípticas, de preceitos
sociais e cerimónias sanitárias que substituíram os ritos religiosos. E
enquanto eles – todos pagos generosamente pelas suas intervenções a qualquer
hora do dia – aterrorizavam a população, os nossos governantes e os políticos ostentavam
as suas máscaras diante das câmaras para, de seguida, as tirarem logo que
possível.
Forçados a mascarar-nos como seres anónimos e sem rosto, impuseram-nos um açaimo,
absolutamente inútil para evitar o contágio e nocivo à saúde, mas indispensável
para nos fazer sentir submissos e aprovados. Impediram-nos de sermos tratados
com as terapias conhecidas e válidas, prometendo-nos uma vacina que, agora,
querem tornar obrigatória antes mesmo de conhecerem a sua eficácia, depois de a
terem testado de forma incompleta; e, para não prejudicarem os enormes lucros
das empresas farmacêuticas, concederam imunidade pelos danos que as suas
vacinas pudessem causar à população. Uma vacina gratuita, disseram-nos, mas que
será paga com o dinheiro dos contribuintes, mesmo que os produtores não
garantam que protegerá do contágio.
Neste cenário que repropõe os efeitos desastrosos de uma guerra, a economia dos
nossos Países está prostrada, enquanto as empresas de comércio online, as
empresas de entrega ao domicílio, as multinacionais da pornografia enriquecem.
As lojas fecham, mas os centros comerciais e os supermercados permanecem:
monumentos ao consumismo em que qualquer um, mesmo com COVID-19, continua a
encher o carrinho com produtos estrangeiros, mozzarellas alemãs,
laranjas de Marrocos, farinha canadiana, telemóveis e televisores made in
China.
O mundo prepara-se para o Great Reset, dizem-nos obsessivamente. Nada será
como antes. Teremos de nos habituar a “conviver com o vírus”, submetidos a uma perpétua
pandemia que alimenta o farmacêutico Moloch e cada vez mais legitima mais as
odiosas limitações das liberdades fundamentais. Aqueles que, desde a infância,
nos catequizaram para o culto da liberdade, da democracia, da soberania popular,
governam-nos actualmente, privando-nos da liberdade em nome da saúde, impondo a
ditadura, arrogando-se um poder que ninguém jamais lhes conferiu, nem do alto
nem de baixo. E aquele poder temporal que a Maçonaria e os Liberais têm
contestado ferozmente contra os Romanos Pontífices é, hoje, reivindicado por
eles ao contrário, na tentativa de submeter a Igreja de Cristo ao poder do Estado,
com a aprovação e a colaboração dos próprios membros da Hierarquia.
De todo este quadro humanamente desanimador, emerge um facto inevitável: há uma
divisão entre quem detém a autoridade e quem a ela está sujeito, entre
governantes e cidadãos, entre Hierarquia e fiéis. Um monstrum
institucional, no qual os poderes civil e religioso estão quase inteiramente
nas mãos de personagens sem escrúpulos, nomeados pela sua absoluta inaptidão e
amplamente chantageáveis; o seu papel não é administrar a instituição, mas
demoli-la, não é respeitar as suas leis, mas violá-las, não é proteger os seus
membros, mas dispersá-los e afastá-los. Enfim, estamos diante da perversão da
autoridade, não por acaso ou inexperiência, mas perseguida com determinação e
seguindo um plano preestabelecido, um único guião sob uma única direcção.
Temos, assim, governantes que perseguem os cidadãos e os tratam como inimigos, enquanto
acolhem e financiam a invasão de criminosos e clandestinos; forças da ordem e
magistrados que prendem e multam quem rompe o distanciamento social, enquanto
ignoram ostensivamente delinquentes, violadores, assassinos e políticos
traidores; professores que não transmitem a cultura e o amor pelo conhecimento,
enquanto doutrinam os alunos para o género e para o globalismo; médicos que se
recusam a prestar os cuidados aos doentes, mas impõem uma vacina geneticamente
modificada cuja eficácia e os efeitos colaterais ignoram; Bispos e padres que
negam os Sacramentos aos fiéis, mas que não perdem a oportunidade para propagar
a própria adesão incondicional à agenda globalista em nome da Fraternidade maçónica.
Quem se opõe a este derrubamento de todos os princípios da vida civilizada
encontra-se abandonado, sozinho, sem um guia que permita unir forças. A
solidão, de facto, permite que os nossos inimigos comuns – como já se demonstraram
amplamente – instilem o medo, o desespero, a sensação de não nos podermos unir
para resistir aos assaltos a que somos submetidos. Estão sozinhos os cidadãos diante
dos abusos do poder civil, sozinhos os fiéis diante da arrogância dos Prelados
heréticos e perversos, sozinhos quantos, nas instituições, desejariam
discordar, levantar a voz, protestar.
A solidão e o medo aumentam quando lhes damos uma consistência, ao passo que
desaparecem se pensarmos que cada um de nós mereceu que a Segunda Pessoa da
Santíssima Trindade se encarnasse no ventre puríssimo da Virgem Maria: qui
propter nos homines et propter nostram salutem descendit de coelis. E aqui
chegamos aos Mistérios que nos preparamos para contemplar nestes dias: a
Imaculada Conceição e o Santíssimo Natal. Deles, caros irmãos, podemos extrair
uma renovada esperança com a qual enfrentar os acontecimentos que nos esperam.
Antes de mais, devemos recordar que nenhum de nós está realmente só: temos ao
nosso lado o Senhor, que quer sempre o nosso bem e que, por isso, nunca nos faz
faltar a Sua ajuda e a Sua graça, se lhas pedirmos com fé. Temos ao nosso lado
a Santíssima Virgem, Mãe amorosa e nosso refúgio seguro. Temos por perto as fileiras
dos Anjos e a multidão dos Santos, que da glória do Céu intercedem por nós ao Trono
da Divina Majestade.
A contemplação desta sublime comunidade que é a Santa Igreja, a mística
Jerusalém da qual somos cidadãos e membros vivos, deve-nos persuadir de que a
última coisa que devemos temer é estar sozinhos e que não há razão alguma para
temer, mesmo se o demónio se desencadeia para nos fazer crer. A verdadeira
solidão está no Inferno, onde as almas condenadas não têm esperança alguma: aquela
é a solidão de que devemos verdadeiramente ter pavor; e, diante dela, devemos
invocar a perseverança final, ou seja, podermos merecer, da Misericórdia de
Deus, uma santa morte. Uma morte para a qual devemos estar sempre preparados, conservando-nos
em estado de graça, na amizade com o Senhor.
Claro, as provações que enfrentamos neste momento são tremendas, porque nos dão
a sensação de que o mal triunfa, que cada um de nós é deixado abandonado a si
mesmo, que os malvados conseguiram levar a melhor sobre o pusillus grex
e sobre toda a humanidade. Mas, porventura, Nosso Senhor não estava sozinho no
Getsémani, no madeiro da Cruz, no Sepulcro? E para voltar ao mistério do Natal
agora iminente: não estavam sozinhos Nossa Senhora e São José quando se viram
obrigados a encontrar refúgio num estábulo porque non erat locus illis in
diversorio? Imaginai como se devia sentir o putativo pai de Jesus ao ver a Sua
santíssima Esposa, próxima do parto, no frio da noite da Palestina; pensai nas suas
preocupações ao fugirem para o Egipto, sabendo que o Rei Herodes havia
libertado os seus soldados para matar o Menino Jesus. Mesmo nestas terríveis situações,
a solidão da Sagrada Família era apenas aparente, enquanto Deus preparava tudo
de acordo com os Seus planos, enviava um Anjo para anunciar o nascimento do
Salvador aos pastores, movia nada menos que uma estrela para, do Oriente,
chamar os Magos para adorarem o Messias, enviava os coros dos Seus Anjos para
cantarem na gruta de Belém, advertia São José para fugir, de modo a escapar ao
massacre de Herodes.
Também a nós, na solidão do confinamento a que muitos somos forçados, no
abandono no hospital, no silêncio das ruas desertas e das igrejas fechadas ao
culto, o Senhor vem trazer a Sua companhia. Também a nós Ele envia o Seu anjo
para nos inspirar santos propósitos, a Sua Santíssima Mãe para nos consolar, o
Paráclito para nos confortar, dulcis hospes animæ.
Não estamos sós: nunca estamos. E é isto, afinal, que os autores do Great
Reset mais temem: que tomemos consciência desta realidade sobrenatural – mas
não por isto menos verdadeira – que faz desabar o castelo de cartas dos seus
enganos infernais.
Se pensarmos que temos ao nosso lado Aquela que esmaga a cabeça da Serpente ou
o Arcanjo que desembainhou a espada para lançar Lúcifer para o abismo; se nos
lembrarmos que o nosso Anjo da Guarda, o nosso Santo Padroeiro, os nossos entes
queridos no Céu e no Purgatório estão connosco: de que deveremos ter medo?
Queremos acreditar que o Deus dos exércitos alinhados tenha algum escrúpulo em
derrotar qualquer servo do eterno derrotado?
Aquela que, em 630, salvou Constantinopla do cerco, aterrorizando os Ávaros e
os Persas ao aparecer terrivelmente no céu; que, em 1091, em Scicli, invocada
como Nossa Senhora das Milícias, se mostrou, numa nuvem brilhante, expulsando
os Sarracenos; que, em 1571, em Lepanto, e que, novamente, em Viena, em 1683,
como Rainha das Vitórias, concedeu a vitória à armada cristã contra os Turcos;
que, durante a perseguição anticatólica do México, protegeu os Cristeros e repeliu
o exército do maçon Elias Calles, não nos negará a Sua santa ajuda, não nos
deixará sozinhos na batalha, não abandonará aqueles que a Ela recorrem com a
oração confiante no momento em que o conflito é decisivo e o confronto se
aproxima do fim.
Tivemos a graça de compreender no que se poderia transformar este mundo se renegássemos
o Senhorio de Deus e o substituíssemos pela tirania de Satanás. Este é o mundo
rebelde a Cristo Rei e a Maria Rainha, no qual, todos os dias, milhares de
vidas inocentes são oferecidas a Satanás no ventre das suas mães; este é o
mundo em que o vício e o pecado querem apagar cada traço de bem e de virtude, cada
memória da Religião cristã, cada lei e vestígio da nossa civilização, cada
traço da ordem que o Criador deu à natureza. Um mundo em que ardem as igrejas, em
que se derrubam as Cruzes, em que se decapitam as estátuas da Virgem: este
ódio, esta fúria satânica contra Cristo e a Mãe de Deus é a marca do Maligno e dos
seus servos. Diante desta Revolução total, desta maldita Nova Ordem Mundial que
deveria preparar o reino do Anticristo, ainda não podemos acreditar que
qualquer fraternidade seja possível excepto sob a Lei de Deus, nem que seja
possível construir a paz excepto sob o manto da Rainha da Paz. Pax Christi in
regno Christi.
O Senhor dar-nos-á a vitória somente quando nos curvarmos a Ele como nosso Rei.
E se ainda não podemos proclamá-Lo Rei das nossas Nações por causa da impiedade
daqueles que nos governam, podemos, no entanto, consagrar-Lhe nós mesmos, as nossas
famílias, as nossas comunidades. E a quem ousa desafiar o Céu em nome do “Nada
será como antes”, nós respondemos invocando Deus com renovado fervor: “Como era
no princípio, agora e sempre, pelos séculos dos séculos”.
Rezemos à Virgem Imaculada, tabernáculo do Altíssimo, para que, na meditação do
Santo Natal do seu divino Filho, agora próximo, Ela dissipe o nosso medo e a
solidão, recolhendo-nos, em adoração, à volta da manjedoura. Na pobreza do
presépio, no silêncio da gruta de Belém, ressoa o canto dos Anjos; brilha a
verdadeira e única Luz do mundo, adorada pelos pastores e pelos Magos; inclina-se
a criação adornando a abóbada celeste com um resplandecente cometa. Veni,
Emmanuel: captivum solve Israël. Vinde, Emanuel: libertai o vosso povo
cativo.
† Carlo Maria
Viganò, Arcebispo
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