A festa da Transladação da Santa Casa
leva-nos a reflectir sobre a estreita ligação entre a humilde morada de Nossa
Senhora e a Contra-Revolução. Mas em que sentido? A seguir, tentamos oferecer
algumas ideias.
Humildade e pureza contra orgulho e sensualidade
O grande mestre do pensamento contra-revolucionário, Plinio Corrêa de Oliveira,
explicava que são, principalmente, o orgulho e a sensualidade que movem a
Revolução: «Se não fosse pelo orgulho e pela sensualidade – escreveu –,
a Revolução, como movimento organizado no mundo inteiro, não existiria, não
seria possível». Com base nesta consideração, pensa-se, então, que nenhum
lugar do mundo é mais hostil à Revolução – e, consequentemente, mais conforme à
Contra-Revolução – do que a Santa Casa de Loreto, pois em nenhum outro ambiente
reinaram a humildade e a pureza mais perfeitas. Entre aquelas paredes sagradas,
de facto, Jesus submeteu-se totalmente a Maria e a José; Nossa Senhora foi
concebida imaculada, permaneceu perpetuamente virgem e, com suma humildade, aceitou
os planos divinos; São José foi o castíssimo esposo de Maria. Ora, sendo o
aspecto tendencial e simbólico – como ensinava Plinio Corrêa de Oliveira – fundamental
para formar uma verdadeira mentalidade contra-revolucionária, deduz-se que uma
peregrinação à Santa Casa será, certamente, salutar para se purificar da doença
revolucionária de que todos, infelizmente, sofremos o contágio.
A Encarnação, antídoto contra o gnosticismo
Na Santa Casa de Loreto, teve início a Redenção do género humano através da
Encarnação do Verbo. No meio daquelas paredes, o Eterno entrou no tempo, Deus
fez-se homem graças ao consentimento da Santíssima Virgem.
Tudo isso torna ainda mais claro o motivo pelo qual aquele lugar abençoado pode
ser considerado o motor da Contra-Revolução. Com efeito, se a primeira
Revolução foi a de Lúcifer e dos anjos rebeldes que, cegos de orgulho, gritaram
a Deus o seu Non serviam, na Santa Casa, em vez disso, uma criatura
imaculada começou a esmagar a cabeça do demónio com o seu humilde e convicto Sim
(Fiat mihi secundum verbum tuum).
Plinio Corrêa de Oliveira definia a Revolução com os dois adjectivos de gnóstica
e igualitária. Pois bem, o que o gnosticismo de todos os tempos rejeita é,
precisamente, a Encarnação. Os gnósticos não podem conceber um Deus que se abaixa
a ser humano, que se humilha assumindo uma carne e um corpo mortais. Além
disso, segundo vários Padres da Igreja, Lúcifer rebelou-se, precisamente,
quando lhe foi preanunciado que teria de adorar a Deus feito homem. Por causa
do seu orgulho, os anjos rebeldes não quiseram aceitar a união hipostática do
Verbo com a natureza humana, em si inferior à angélica. Mais ainda, não podiam
aceitar que uma mulher, Maria Santíssima, humilde criatura, fosse o meio pelo
qual tal união se realizou. Por certo, no centro do pensamento gnóstico está a
ideia prometeica do homem que se rebela contra a criação e que, em última
instância, se faz Deus. Mas se Cristo é Deus que se faz homem, então o homem
que se faz Deus é o Anticristo. Assim sendo, aqui está delineado o embate entre
os dois estandartes, o de Cristo e o de Satanás; em suma, o embate entre a
Revolução e a Contra-Revolução.
A devoção à Santa Casa de Loreto, desse modo, exaltando a Encarnação do Verbo,
é eminentemente contra-revolucionária.
A escravidão mariana e a Contra-Revolução
Entre as sagradas paredes da Casa de Loreto, São Luís Maria Grignion de
Montfort teve a inspiração de escrever o seu Tratado da Verdadeira Devoção à
Santíssima Virgem: e, na verdade, que lugar mais adequado para escolher viver
a escravidão de amor a Nossa Senhora? Efectivamente, não é por acaso que o
grande santo francês recomendava aos escravos de Maria que celebrassem com
particular solenidade o 25 de Março, festa da Anunciação. Com efeito, como
Jesus, encarnando-se no ventre de Maria, se fez totalmente dependente d’Ela,
também quem vive a consagração pregada por Montfort se entrega totalmente à Mãe
de Deus. São Luís chegou mesmo a escrever que «Jesus Cristo deu mais glória
a Deus Pai pela sua submissão a Maria durante trinta anos, do que lhe teria
dado se convertesse toda a terra operando os maiores prodígios». Enfim,
Deus, para o bem da humanidade, aceitou humilhar-se fazendo-se homem e
fechando-se no ventre de uma criatura: uma verdadeira bofetada ao igualitarismo
revolucionário.
A Revolução contra a Santa Casa
A quem tiver dúvidas sobre esta ligação entre a Santa Casa e a
Contra-Revolução, basta recordar quais forças, ao longo dos séculos, atacaram a
autenticidade daquelas paredes e a veracidade histórica das suas milagrosas
transladações: protestantes, iluministas e modernistas.
Não é difícil compreender o motivo desta oposição. A Santa Casa, directa ou
indirectamente, é a manifestação mais límpida da essência do Catolicismo:
- Recebeu reconhecimentos e privilégios de numerosos Sumos Pontífices.
- Trata-se de uma relíquia ligada, sobretudo, a Nossa Senhora, exterminadora de todas as heresias.
- Foi milagrosamente transportada, de Nazaré para Loreto (e, anteriormente, para outros lugares), para escapar à dominação islâmica.
- Converteu protestantes, hebreus, muçulmanos e incrédulos à Igreja Católica.
- Sobre o altar que ainda se encontra no seu interior, o chamado altar dos Apóstolos, segundo a tradição, São Pedro celebrou a primeira Santa Missa. Ora, o gnosticismo odeia a humanidade de Cristo porque foi com a sua carne que Jesus nos salvou, continuando a fazê-lo através da sua real presença na Eucaristia.
Para além disso, a Santa Casa desempenhou um papel imprescindível na defesa da Europa cristã. É a Nossa Senhora de Loreto, a título de exemplo, que os Papas e os comandantes se dirigem antes de enfrentar – entre outras – as duas batalhas mais decisivas e célebres contra o Islão: a de Lepanto (1571) e a de Viena (1683).
Um exemplo entre muitos. Marco António Colonna, comandante da frota pontifícia, foi a Loreto antes da batalha de Lepanto, deixou a sua esposa a rezar no santuário durante a batalha naval e, depois, voltou para agradecer à Mãe de Deus pela vitória. Não só. Os prisioneiros cristãos, libertados da escravidão turca, doaram ao santuário as suas correntes, que foram derretidas e utilizadas para construir portões e balaustradas das capelas laterais da basílica.
A Providência ordenou, posteriormente, que
os defensores do Papado e da Igreja contra o “novo turco” do liberalismo e do
agnosticismo oferecessem as suas vidas sob o olhar amoroso de Nossa Senhora de
Loreto, a 18 de Setembro de 1860, na batalha de Castelfidardo.
Os princípios não negociáveis
A Santa Casa pode e deve ser vista, pelos fiéis do terceiro milénio, também
como o Santuário dos princípios não negociáveis. Ali, realmente, foram
concebidos Nossa Senhora e Jesus; ali morreria São José entre os braços de
Jesus e Maria; ali viveu a Sagrada Família; ali Jesus cresceu e foi educado. Em
Loreto, à vista disso, é possível encontrar a energia espiritual para combater,
com o especial vigor exigido por estes tempos calamitosos, o bom combate em defesa
da sacralidade da vida inocente, desde a concepção até à morte natural, da
família natural, da indissolubilidade do matrimónio e do direito primário dos
pais educarem os seus filhos.
O
papel dos leigos
Poder-se-ia
continuar a reflectir por muito tempo. Mas, por ora, talvez seja suficiente limitarmo-nos
a uma última consideração. Meditar sobre a Encarnação em Loreto é, também, um
estímulo para os leigos empenhados na consecratio mundi, ou seja, a
consagração da ordem temporal à luz da realeza social de Cristo. O passionista
P. Enrico Zoffoli (1915-1996), com uma feliz definição, escreveu que o apostolado
dos leigos, caracterizado pelo esforço de mediação entre a sociedade e os
membros da hierarquia, «poderia considerar-se como a última fase da encarnação
do Verbo nas estruturas humanas de todos os tipos e a todos os níveis da vida
profana».
Resta, então, convidar todos a irem a Loreto e conhecerem sempre mais a
história e os milagres da Santa Casa. A restauração da Civilização Cristã passa
por aquelas humildes paredes que exalam sacralidade.
Federico Catani
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