O Papa
pensa nos «pobres uigures», a China responde ressentida negando a
perseguição aos uigures, viva o Papa que defende os direitos humanos. Em poucas
palavras, é esta a sequência das reacções depois de terem saído algumas
antecipações de mais um livro-entrevista do Papa Francisco, que estará nas
livrarias a 1 de Dezembro. “Voltemos a sonhar” é o título, a entrevistá-lo foi um
dos jornalistas da corte, o britânico Austin Invereigh. A polémica nasce porque
o Papa, falando das periferias e das margens da sociedade, afirma: «Muitas
vezes, penso nos povos perseguidos: os Rohingya, os pobres Uigures, os Yazidis –
o que o ISIS lhes fez foi, verdadeiramente, cruel – ou os cristãos, no Egipto e
no Paquistão, mortos por bombas enquanto rezavam na igreja».
Foi o suficiente para o governo chinês se levantar; assim, ontem, o porta-voz
do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Zhao Lijian, respondeu imediatamente,
argumentando que as acusações do Papa «não se reflectem nos factos». Mais,
na China «povos de todos os grupos étnicos gozam de todos os direitos de
existência, desenvolvimento e liberdade de crença religiosa».
Isso foi, obviamente, lançado pelos media um pouco em todo o Mundo: antes de
mais, porque o Papa Francisco é a primeira vez que menciona não apenas os
uigures, mas, de forma mais geral, algo errado na China (mesmo que o nome China
não tenha sido pronunciado); além disso, a pergunta e a resposta ocorrem num
período delicado nas relações entre a China e a Santa Sé, visto que o acordo
secreto sobre a nomeação dos bispos católicos acaba de ser renovado.
Obviamente, há quem tenha notado a demora com que o Papa Francisco levantou a
questão dos uigures, população muçulmana que vive na província chinesa de
Xinjiang e dos quais cerca de um milhão estão nos campos de trabalho e de reeducação.
E também há quem tenha notado que, mais uma vez, o Tibete, a região que a China
maoísta ocupou em 1950, foi ignorado. Se, depois, esta é a razão, poder-se-iam
acrescentar outros grupos perseguidos, como o Falun Gong.
Mas nessas críticas há, evidentemente, uma expectativa e uma forma distorcida
de olhar para o Papa como se ele fosse o Conselho de Direitos Humanos da ONU. O
verdadeiro problema é que ignora totalmente que, na China, são perseguidos os
cristãos, católicos à frente. O Papa é, antes de tudo, o pastor dos católicos e
podemos pensar no estado de espírito dos católicos chineses, que sofrem com a clandestinidade
e a perseguição, ao ver que o seu “pai” se preocupa com os muçulmanos e se
esquece dos próprios filhos. Como julgaríamos um pai que, precipitando-se ao
local do acidente, se desinteressasse do seu filho e se preocupasse, antes de
tudo, com as condições dos outros colegas de escola?
Além disso, a divulgação das antecipações do livro-entrevista do Papa acontece –
no que diz respeito à questão chinesa – num momento infeliz, visto que quase
chegou contemporaneamente a notícia da ordenação episcopal, na China, de Mons.
Thomas Chen Tianhao, para a Diocese de Qingdao, na Província de Shandong.
Segundo a declaração oficial da Sala de Imprensa vaticana, trata-se do «terceiro
Bispo nomeado e ordenado no quadro normativo do Acordo Provisório entre a Santa
Sé e a República Popular da China sobre a nomeação dos Bispos». Na
realidade, é preciso dizer que é o primeiro, considerando que a ordenação dos
dois precedentes – como já explicámos noutras ocasiões – tinha sido decidida
muito antes do acordo.
Mas, além desse detalhe, o perfil do novo bispo reforça a convicção de que o
acordo entre a China e a Santa Sé seja, na verdade, a venda dos católicos ao
regime comunista chinês. Como, efectivamente, nota a agência AsiaNews, «o
novo bispo é conhecido como um leal funcionário do Estado no que diz respeito à
política religiosa». E ainda: «foi presidente da Associação Patriótica
de Qingdao e, desde 2010, é membro do Comité Permanente da Associação
Patriótica Nacional». Como se não bastasse, a missa de ordenação viu o uso
da velha fórmula da consagração, «na qual se cita o mandato do Conselho dos bispos,
mas nada se diz sobre o Papa e a Santa Sé».
Na prática, avança o programa de chinização da Igreja, com a aprovação da Santa
Sé, que já pré-anunciou que, «certamente no futuro, se preveem outras
consagrações episcopais, porque vários processos para as novas nomeações
episcopais estão em andamento».
Portanto, a partir destas notas compreendemos que está tudo a correr bem para o
Vaticano na China, exceptuando aquela pequena falha no tratamento dos uigures.
A Igreja perseguida deve ser uma invenção da propaganda populista, que não
gosta do diálogo, que constrói muros em vez de pontes.
Riccardo Cascioli
Através de La Nuova Bussola Quotidiana
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